Às moscas
Penso que estamos todos
abandonados às moscas. Nos incomodam, pousam na nossa sopa, zumbem e não nos
deixam dormir. São as moscas de um eterno tédio. Um tédio paradoxal, em que não
faltam coisas a fazer, mas em que nada nos parece interessante. Cercados de
cobranças de “fazer algo de útil”, numa correria em que não conseguimos parar
para pensar direito.
Nem para contemplar esse
belíssimo por do sol tão alaranjado, diante do qual devaneio produtivamente...
Numa paisagem tão excitante não deveriam caber moscas.
Ah! O lirismo que busco todos
os dias de minha vida... Em “passar o tempo vendo o tempo passar”, aprender com
cada pequena coisa, bicho, pessoa, com o amor de todo dia, com o dia de todo
cotidiano, com a vida, a raiva e a “insustentável leveza” do ser.
O que fazer com as moscas? Seria
preciso prendê-las dentro de um grandessíssimo relógio burguês fabril para que
tivessem uma verdadeira utilidade: desativassem esse tempo enclausurador,
cagassem suas engrenagens e confundissem
sua direção. Ou pintar o teto de azul – como ensinou Braga, e alguém ensinou a
ele –, pois creio que já descobri o segredo: trazendo o céu pra dentro de casa,
as moscas do tédio se confundem e vão procurar outras plagas. Talvez em outro
mundo.
Belo texto! Gostei!
ResponderExcluirAlguém aqui andou lendo muito Benjamin, porque está me saindo uma linda flâneur ... :)
ResponderExcluirComo sempre te leio sabendo que vou ficar admirada com tuas palavras...
Que bom! você voltou e com um elo texto.
ResponderExcluirQue bom! você voltou e com um belo texto.
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