Declaro, nem tão solenemente
São 10 anos de Cerrado.
Me dei conta disso neste momento. Desde a primeira vez que passei por essas
bandas, os morros e chapadões me encantaram. As árvores tortas, os ipês,
salgueiros chorões das cidades, os tucanos pequenos, as araras azuis e amarelas
aos pares, os gaviões sempre atentos, as corujinhas que gostam de ficar no meio
da rua. O céu muito azul do tempo seco. Ah, o tempo seco de que eu nunca
aprendi a gostar! Menos por ser a melhor época para fazer trilha até as
cachoeiras de água muito límpida, azuis ou verdes, o tempo seco é o que sempre
me torturou.
Sinto falta da
chuva, sinto falta do cheiro de terra molhada, mas sinto falta principalmente
da hidratação natural da minha pele amazônida, acostumada à muita umidade de
Belém. De respirar ar sem poeira, sem sentir que o vento traz um grão de terra
pra cobrir cada poro da minha pele. Vejam que estamos em março, ainda chove (e
muito!), mas já estou preocupada com o tempo seco que há de vir. Porque, na
verdade, é só parar um pouquinho a chuva, em qualquer época, que toda gotícula do
ar já começa a se escafeder. O calor do Cerrado é diferente, ele vem como air
fryer: fritando a gente no ar quente, sem necessidade de óleo. Na planície
belenense, o calor é de panela de pressão: cozinhando a gente no caldo do
próprio suor. Aliás, taí uma coisa boa do tempo seco: o suor também seca que
você nem vê. A menos que, como eu, a pessoa desenvolva algum problema de
sudorese específico, como suar tanto na palma do pé que nem é possível calçar uma
sandália. Sim, nessa época eu tenho um chulé medonho.
Mas a verdade é
que o tempo seco sustenta a dinâmica do Cerrado, antes das chuvas retornarem
pra imperar nos próximos 6 meses. Ele começa em maio e, ao calor do dia, começa
a contrastar o friozinho das noites, que vai ficando mais forte entre junho e
julho. Os ipês florescem um atrás do outro: primeiro os rosas e lilases, depois
os amarelos e, por último, os brancos. Agosto é um festival de cores, sob o céu
muito azul, sem uma nuvenzinha sequer. E as noites frias vão embora, e dormir
começa a ser uma luta infernal, de bafo quente das profundezas da terra. Até
outubro, quando tudo parece estar no seu limite, e você torce para que chegue
novembro, pra enxarcar a terra laranja ressecada e tudo voltar a renascer. Seca
e chuva, isso é o Cerrado, e muito que bem.
E vocês me
desculpem o desabafo, mas é que eu amo mesmo esse lugar, tanto quanto amo minha
Amazônia, e o amor tem seus altos e baixos. Belém sabe que o calor de lá também
foi motivo pra eu ir embora.
Uma tarde de julho, em Pirenópolis (2014). Foto: Larissa Leal |
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