De cidades e árvores
Se
um dia me perguntassem do que mais gosto em Goiânia, diria que dos chorões, das
barrigudas e, é claro, dos ipês. Creio que isso aborreceria boa parte da
pequena burguesia goiana, afinal, com tanta coisa pra se olhar, acham eles, eu
me encanto por algumas árvores? Mas creio também que isso não os poderia
aborrecer, afinal, não sou nenhuma personalidade importante a quem fariam essa
estúpida pergunta de entrevista de coluna social. No máximo perguntam, as
pessoas comuns como eu, se gosto da cidade, e é bem mais simples responder sim
ou não (depende do meu humor, ou seja, dos hormônios), o que poupa o
aborrecimento dos outros e as minhas reflexões sobre paisagens.
Ipê na rua 15, setor Marista |
Mas como nada me perguntaram, falo agora
porque me deu vontade, nessa reflexão vegetal súbita, oras. E enfim, como
dizia, são essas três árvores as coisas que mais me encantam nessa cidade,
coisa bem comum de gente assim meio poética e meio vulgar, que se encanta com
umas folhas caídas, umas flores que têm data certa para aparecer, que obedece
humildemente aos caprichos do tempo, o mesmo que castiga os homens que não
podem (porque não querem) despirem-se impudicamente nesta secura e nem querem
(porque não podem) florescer anunciando um novo tempo. O chorão, exceção de ambos
os casos, é, porém, uma paixão de liberdade, tem algo de desprendimento do
tempo, obedecendo apenas a si próprio, sem flores a oferecer, mas servindo de
abrigo aos passarinhos, talvez por isso seja uma das árvores preferidas das
casas goianas, não das avenidas e praças dos ipês e barrigudas. Aliás, praças e
avenidas essas que me parecem carecer de mais alguns exemplares, afinal, uma
das principais avenidas da cidade está toda ornada das benditas palmeiras
imperiais que, apesar de bonitas, não oferecem mais nada de original a lugar
nenhum e ainda roubam um espaço onde nessa época poderiam haver flores amarelas
pelo chão, em maio flores rosadas e no resto do ano o verde claro, um tanto
ausente no cerrado.
Sou
dessas pessoas que gosta de árvores, que vêm nelas (li isso em algum lugar...)
o exercício da paciência e a quem agrada ver através delas alguma coisa própria
do lugar. Em Belém, me encantam as Samaumeiras, árvores gigantes, eretas,
espaçosas demais, em cujo tronco eu poderia morar. Não que haja muitas
samaumeiras espalhadas pela cidade, afinal, tomariam, em algumas décadas, todo
o espaço e creio que se não fossem cortadas as pessoas teriam mesmo que morar
nelas. Um amigo aspirante a arquiteto, também apreciador de árvores, me disse,
há um tempo, que eu deveria tirar da minha cabeça a ideia de ter uma samaumeira
na minha futura casa que ele vai projetar, porque logo eu teria que escolher
entre a casa e árvore. Como já disse, já projetei morar numa, só teria que
superar a questão da altura. Não me levem a sério, só não gosto de ser
contrariada. As samaumeiras, como ia dizendo, me encantam mais do que as
mangueiras - estas sim, muitíssimo mais comuns na cidade, apesar de que também
lá existe um grande domínio de palmeiras nem sempre imperiais – pois caminhar
sob mangas maduras é algo mais assustador que poético. Dirão, os conhecedores
das samaumeiras mais famosas de Belém, que caminhar sob centenas de periquitos
também não é lá muito agradável, já que, por serem centenas, a mira nem precisa
ser das melhores, você com certeza será atingido por certo dejeto natural, mas
eu digo que é sim, além de causa facilmente reversível, mais poético e tem algo
de Quintana e seu famigerado fio de vida c***. O meu também está constantemente
assim, mas ainda acho melhor que uma manga para parti-lo de vez.
Quanto às barrigudas, os chorões e os ipês de
Goiânia, tudo que até agora despencaram sobre mim foram algumas folhas e
flores, e talvez um cocô de passarinho solitário, e isso me faz bem. Sinto que
estou mais outonal e mais primaveril, eu que até então só sabia o que era verão
e inverno, ou melhor, o que era calor e chuva, estou aprendendo outros ciclos,
outras maneiras de perceber que é tempo de renovar. E na casa que eu ainda
pretendo ter, não sei onde, creio que meu amigo arquiteto terá que arranjar
ainda mais espaço para três novas moradoras, embora bem mais discretas.
Ah Lali... como apreciadora de árvores, digo que adorei mais este teu texto. Pra mim ainda faltou o farfalhar (adoro esse verbo, farfalhar, se for uma onomatopeia, deveriam classifica-lo como tal hehe) das folhas ao vento... Pra mim a prova absoluta de um quase silêncio... por mais que nada se mova, há vida no balançar daquelas folhas... *-* mas enfim, teria que fazer uma crônica pra mim também XD Acho que se falasse da minha apreciação das árvores, falaria também das sementes voadoras e em formato de hélice de helicóptero, mas aí já é outra história... beijão, amor, te amo =)
ResponderExcluirMas sobre a nossa apreciação das árvores dá mesmo pra fazer mil crônicas! Eu também teria muitas observações novas a fazer nessa aqui mesmo, mas deixa assim, fica pra próxima, que com certeza virá.
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